Operação de fiscalização, apoiada pelo WWF-Brasil, flagra roubo de madeira, grilagem e garimpo dentro da Terra Indígena Uru-eu-wau-wau.Visita à Floresta Nacional do Bom Futuro constata desmatamento, pecuarização e atividade madeireira ilegal na unidade de conservação
Bruno Taitson
As áreas protegidas no estado de Rondônia vivem uma situação crítica, ameaçadas por invasões e atividades ilegais como exploração madeireira, garimpo e pecuária. Uma equipe do WWF-Brasil esteve na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau e na Floresta Nacional do Bom Futuro e presenciou a ação de desmatadores que não respeitam sequer as fronteiras das áreas protegidas, cuja conservação está prevista em legislação federal.
Acompanhamos uma ação de fiscalização na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau, que resultou em prisões de infratores e apreensões de veículos e equipamentos. Também visitamos a Floresta Nacional do Bom Futuro, que tem cerca de um terço de sua área desmatada e é habitada por milhares de pessoas.
A fiscalização na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau, coordenada por Associação Etnoambiental Kanindé, Fundação Nacional do Índio (Funai), Associação do Povo Indigena Uru-eu-wau-wau, Associação do Povo Indígena Amondawa, Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam) e Polícia Ambiental de Rondônia, teve um saldo impressionante: em 15 dias de operação foram efetuadas 29 prisões, por roubo de madeira, garimpo, invasão e grilagem de terras.
Foram apreendidos com infratores, durante a ação, um caminhão com 52 ripas de castanheira (árvore que, quando nativa, tem corte, transporte e venda proibidos em todo o território nacional), quatro motocicletas, três motosserras, três espingardas e um revólver calibre 38.
Israel Vale, representante da ONG Kanindé, avaliou a ação como positiva, por ter demonstrado que a situação da Terra Indígena Uru-eu-wau-wau continua preocupante. “Desarticulamos em tempo recorde os grileiros, além de marcarmos presença naquela região, desencorajando os infratores a cometer novas invasões”, disse. Dentre os invasores da Terra Indígena encontram-se grandes proprietários de terra, que extraem madeira e criam gado, dentre outras atividades.
O lado negativo da ação de fiscalização ficou por conta da impunidade. Na primeira prisão, efetuada no dia 16 de junho, o infrator ficou menos de 24 horas detido, recebendo de volta a motocicleta que utilizava. Dos 26 invasores presos dia 23 de junho, apenas dois permaneceram na cadeia.
Israel Vale destaca que a situação crítica constatada pela fiscalização é apenas mais um exemplo do descaso do poder público em relação às áreas protegidas de Rondônia. “O dia a dia na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau é marcado por grilagem, invasões, roubo de madeira e ameaças aos indígenas, que são os verdadeiros donos dali. Os crimes ambientais são uma realidade recorrente em diversas regiões do estado”, afirmou.
Em abril de 2007, o WWF-Brasil, em matéria publicada na internet, alertou para ameaças a unidades de conservação em Rondônia, citando como um dos exemplos a Terra Indígena Uru-eu-wau-wau.
Floresta Nacional do Bom Futuro
Já nos arredores da Floresta Nacional do Bom Futuro, percebe-se a presença de dezenas de madeireiras. Nas estradas, os veículos que predominam são os chamados jericos, montados a partir de peças de carros, tratores e caminhões. São sem licenciamento, que normalmente não possuem faróis, luzes ou qualquer outro equipamento de segurança. Transportam madeira de forma precária e clandestina, colocando em risco a vida de pedestres e motoristas.
De acordo com o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), mais de um terço da área da Flona do Bom Futuro, criada em 1988, já foi devastada. Na entrada, uma placa do ministério do Meio Ambiente demarca o início da unidade de conservação. Logo atrás da placa, já dentro da Flona, uma fazenda, com cercas de arame e algumas cabeças de gado, numa flagrante violação à lei.
De acordo com Ivaneide Bandeira, diretora da ONG Kanindé, a omissão das autoridades diante das invasões na Bom Futuro é “muito grave”, uma vez que sinaliza para a sociedade que não há punição para aqueles que desmatam áreas protegidas. “O pior é que há grandes propriedades, com centenas de cabeças de gado”, relatou.
Desde maio o Exército Brasileiro, a Força Nacional e o ICMBio organizam uma operação na Flona do Bom Futuro, com objetivo de impedir a extração e o transporte de madeira ilegal, retirar o gado, cadastrar moradores, impedir novas invasões e recuperar áreas degradadas. Já foram feitas diversas apreensões, especialmente de madeira extraída dentro da unidade de conservação.
Entretanto, no dia 2 de junho foi assinado um acordo pelo governador de Rondônia, Ivo Cassol, o presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Rômulo Barreto Mello, e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, passando a administração de cerca de 140 mil hectares da Flona, que tem área total de 272 mil hectares, para as mãos do Estado de Rondônia. Assim, os moradores que ocupam a unidade de conservação teriam sua situação regularizada.
Em contrapartida, a União passaria a administrar as unidades de conservação estaduais denominadas Floresta Estadual Rio Vermelho (A e B), Estação Ecológica Serra dos Três Irmãos e Estação Ecológica Mujica Nava, que somadas ocupam cerca de 180 mil hectares.
Segundo Ivaneide Bandeira, o acordo é um retrocesso. “Unidades de conservação não podem virar moeda de troca. Legalizando as invasões que já aconteceram, o poder público sinaliza que não há problema em invadir, já que depois acontece a regularização. Estão rasgando a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc)”, criticou.
Apesar das placas que demarcam a Flona e de visitas de autoridades ambientais à área, os produtores que moram no interior da Floresta Nacional do Bom Futuro alegam que pagaram pelos terrenos a terceiros e ignoravam o fato de a área ser uma unidade de conservação.
Fonte: WWF Brasil
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