quinta-feira, 7 de julho de 2011

Conflitos vêm à tona com usina de Serra Quebrada

TI Apinajés (TO) - Perguntar sobre a Usina Hidrelétrica Serra Quebrada,  prevista pelo Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE (2007/2016)  para entrar em operação na divisa do Tocantins com o Maranhão em 2013 é  quase uma ofensa para o povo indígena Apinajé. Há mais de dez anos, desde quando iniciou o planejamento da barragem, os  índios que habitam a região tocantinense conhecida como "Bico do  Papagaio", se opõem à liberação do projeto do consórcio Eletronorte/  Camargo Corrêa, que recebeu em fevereiro deste ano, do Instituto  Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o  Termo de Referencia (TR) para elaboração do EIA/Rima (Estudo e  Relatório de Impacto Ambiental). Dados do Ibama mostram que será formado um  reservatório de aproximadamente 386 km2, inundado terras dos municípios  de Governador Edson Lobão, Ribamar Fiquene, Montes Altos, Campestre do  Maranhão, Porto Franco e Estreito no estado do Maranhão e Itaguatins,  Maurilândia do Tocantins, Tocantinópolis e Aguiarnópolis, no estado do  Tocantins.


 TI Apinajés (TO) - Perguntar sobre a Usina Hidrelétrica Serra Quebrada,  prevista pelo Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE (2007/2016)  para entrar em operação na divisa do Tocantins com o Maranhão em 2013 é  quase uma ofensa para o povo indígena Apinajé.

 Há mais de dez anos, desde quando iniciou o planejamento da barragem, os  índios que habitam a região tocantinense conhecida como "Bico do  Papagaio", se opõem à liberação do projeto do consórcio Eletronorte/  Camargo Corrêa, que recebeu em fevereiro deste ano, do Instituto  Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o  Termo de Referencia (TR) para elaboração do EIA/Rima (Estudo e  Relatório de Impacto Ambiental).

 Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), os grupos fabricantes de  alumínio Alcoa Alumínio e a Billiton Metais -- a primeira dos Estados  Unidos e a segunda inglesa -- são os interessados na energia gerada p ela  usina, que terá potência instalada de 1.328 MW. Conforme o mesmo plano,  a avaliação processual do empreendimento está atrasada.

 Cravada no corredor do desenvolvimento Norte-Sul, a Terra Indígena  Apinajé, 141.904 hectares com projeto de ser ampliada, vem desde a  década de 50 sofrendo duras intervenções de obras governamentais. Foi  cortada por ferrovias (Carajás e Norte-Sul), rodovias (BR 153,  Transamazônica e TOs 126 e 134), linhas de tensão (Linhão de Tucuruí),  sofreu os impactos de hidrelétricas (Estreito e Lajeado), e se prepara  pra chegada da Hidrovia Tocantins/Araguaia, prestes a sair do papel.

 Mas nenhum desses empreendimentos gerou tanta preocupação nos Apinajés  como a UHE Serra Quebrada, que "comerá" cerca de 14% da TI, exatamente  nas margens do Rio Tocantins, onde existem babaçuais e de onde os índios  retiram a maior parte do sustento das 1.700 pessoas que vivem hoje nas  24 aldeias.

 Sem o estudo, não vai

 O aproveitamento hidrelétrico de Serra Quebrada está projetado para ser  implantado no rio Tocantins, entre os municípios de Governador Edson  Lobão (MA) e Itaguatins (TO). Dados do Ibama mostram que será formado um  reservatório de aproximadamente 386 km2, inundado terras dos municípios  de Governador Edson Lobão, Ribamar Fiquene, Montes Altos, Campestre do  Maranhão, Porto Franco e Estreito no estado do Maranhão e Itaguatins,  Maurilândia do Tocantins, Tocantinópolis e Aguiarnópolis, no estado do  Tocantins. A previsão é que cerca de 14 mil pessoas sejam deslocadas,  mas o número pode ser ainda maior.

 Segundo o Ibama, o projeto aguarda análise dos estudos para emissão da  Licença Prévia (LP), mas o que depender dos índios, técnicos ligados à  obra não terão permissão para fazer pesquisas dentro da área. Para eles,  o assunto só tem uma reposta, a mesma que vem sendo dada nos últimos  anos: "não queremos , e ponto final", disse categoricamente Cassiano  Apinajé, 43 anos, da aldeia São José.

 Ele assistiu a liberação da UHE de Estreito e hoje reclama a falta de  peixes para alimentar as comunidades. "Agora é só sofrer o impacto, não  tem como desmanchar. Por isso ninguém entra aqui. O pessoal chega como  os antigos colonizadores, invadindo e desconsiderando a gente. Ninguém  aceita a barragem e vamos resistir nem que para isso haja mortes",  indigna-se Cassiano.

 E a resistência não é só contra Serra Quebrada, atrás dela vêm outras  hidrelétricas que também serão instalados na bacia do rio Tocantins,  como as usinas de Marabá, Tupiratins e Tocantins, que também afetarão a  TI Krikati, no Maranhão. "Estamos aqui e essa água vai atingir a gente",  completa Joanita Apinajé, 70 anos, que já teve vários pesadelos com a  inundação da TI.

 Joaquim Preto Apinajé, 70 anos, atual cacique da aldeia Mariazinha,  lembra que a mobilização da comunidade contra o projeto teve início em  setembro de 2001, com a divulgação da Carta do Povo Apinajé: "A terra  para nós é mãe e pai, a terra é quem cria nós e não o governo, pois é  dela que tiramos a nossa caça, nossa pesca, os remédios, coletamos os  frutos, principalmente o babaçu, que é muito importante para nossa  sobrevivência", dizia a Carta. Ele conta que se a Eletronorte "teimar"  em começar construir a barragem, vai haver briga. "Não aceitamos a obra,  nossas melhores terras estão sendo ameaçadas", alerta o ancião.

 Alerta

 Em 2003, quando começou a ser falar oficialmente da Serra Quebrada o  Ibama, em relatório de vistoria, já havia alertado a Eletronorte sobre  os trâmites legais para a viabilidade do empreendimento. Na nota técnica  n 010/2003, o órgão aconselhou: "o aproveitamento hidrelétrico de Serra  Quebrada possui restrições ambientais, com interferências em áreas  indígenas, necessitando, portanto, de regulamentação do artigo 231 da  Constituição Federal, que dispõe sobre os direitos indígenas, para sua  viabilização e posterior integração em futuros programas de licitação". O  artigo determina que "as comunidades indígenas têm direito ao usufruto  exclusivo às terras que tradicionalmente ocupam (...)".

 Desde então, mesmo sem nenhum estudo na TI, o processo parece correr a  passos largos no órgão, e apesar de irredutíveis, os índios receiam não  serem mais uma vez escutados.

 Em relatório de vistoria do Ibama de 2008, técnicos e representantes da  Consultoria Ambiental Themag, responsável pela elaboração do Consórcio  Empreender Eletronorte/Camargo Corrêa, acertaram que a elaboração do  EIA/Rima deverá condicionar as contribuições da Funai à elaboração dos  estudos na TI Apinajé, por meio da emissão de um TR específico.

 Longe dos processos, os índios acreditam que os  estudos estão avançando  sem barreiras, ou ainda, já estejam parcialmente concluídos.  "Infelizmente nós não temos voz nesta luta. Entramos em decadência,  embora a gente resista, essas obras vêm com uma força terrível, atropela  a vida da gente, não respeitam os nossos direitos", lamenta Cassiano.

 Pressionados

 A articulação direta da Eletronorte com os índios se intensificou em  2009. Segundo Fernando Schiavini, antropólogo indigenista da Fundação  Nacional do Índio (Funai), no ano seguinte a estatal tentou "cooptar" os  índios para permitir os estudos. "Levaram uma comissão com dez apinajés  de avião para Brasília, hospedados nos melhores hotéis da cidade só  para tentar convencê-los", lembra Schiavini.

 "Durante quatro horas eles bateram pesado, usaram todo tipo de  argumento, de que o Brasil precisava de energia e desenvolvimento. Cada  liderança falava e a gente não aceitava", diz Antônio Apinajé, da al deia  São José, onde cultiva junto com a família, mandioca, milho, arroz,  feijão e banana, tudo orgânico e com sementes "crioulas". Atualmente ele  está experimentando um novo formato de produção de hortaliças, a horta  em mandala.

 Antônio lembra as propostas "descabidas" da empresa estatal. "Eles  queriam levar nós na usina de Tucuruí, onde eles dizem ter um programa  muito bom da Eletronorte, que é muito bonito e bom pros Paracanãs.  Falamos que a gente não queria e que esse assunto da Serra Quebrada  estava encerrado para nós".

 Este ano, os assédios continuaram, e em um documento formal enviado a  Funai e a Eletronorte, os índios reafirmaram não permitir nenhuma visita  à TI. "Nós não quer mais falar, é bom deixar isso pra lá. A gente sabe  que o desenvolvimento do país não é só construção de barragem, tem o  desenvolvimento cultural, ambiental, que o governo tem que olhar",  finaliza Antônio, já alterado.
  Área impactada

 Nos relatórios de vistoria emitidos pelo Ibama, em 2008, a Coordenação  de Energia Hidrelétrica e Transposição observou que os fragmentos  remanescentes de vegetação nativa ainda conservados se encontravam na TI  Apinajé. O aumento de desmatamento para pastagem, plantação de soja e  eucalipto vem descaracterizando a região, e também é reclamação  constante dos índios, que dizem estar sendo "asfixiados" pelo  crescimento do agronegócio.

 Os mesmos documentos também afirmam que o local onde será instalada  Serra Quebrada é de importância biológica relevante. Num raio de 10km da  área que será alagada, encontra-se a Unidade de Conservação Reserva  Extrativista Mata Grande. A região também é classificada pelo Centro  Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (Cecav) como de alta  potencialidade de ocorrência de cavernas.

 Em 2001, o Centro dos Direitos das Populações da Região de  Carajás -  Fórum Carajá, disse que Serra Quebrada destruiria áreas importantes para  a reprodução de tartarugas, entre outras espécies, como a pantera  suçuarana (puma concolor) e jaguatirica ocelot (leopardus pardalis),  cujo habitat será atingindo.

 "Cada vez que se destrói uma área natural, que é resultado de anos e  anos, nunca mais ela se recupera, pois o conjunto gênico de espécies é  único", explica a Dr. Elineide Eugênio Marques, do Núcleo de Estudos  Ambientais (Neamb), da Universidade Federal do Tocantins, em Porto  Nacional.

 Siqueira pede aceleração de processo

 No final do mês de maio, o governador do Tocantins, José Wilson Siqueira  Campos (PSDB), esteve em Brasília solicitando ao diretor -geral da  Agência Nacional de Energia Elétrica (Anael), a realização de leilões  para a construção UHE de Serra Quebrada e Tupiratins. Ele também pediu a  retomada das obras da UHE Santa Isabel e que os estudo s para a  construção da UHE Pau D'Arco, no Rio Araguaia, sejam concluídos.

 Segundo o governador, estas barragens diminuirão o assoreamento do  Araguaia, fazendo naturalmente o controle das enchentes provocadas por  chuvas, garantindo assim o curso normal, com preservação das margens e  das águas do rio. No encontro também foi solicitado ao diretor geral da  Aneel a retomada dos estudos para construção das PCHs - Pequenas  Centrais Elétricas e Médias Centrais Elétricas no estado.

 Raio X - Usina Hidréletrica de Serra Quebrada

 Bacias Hidrográficas Araguaia - Tocantins

 Rios Tocantins

 Potência 1.328 MW

 Área de inundação 386 Km²

 Pessoas afetadas (oficial) 14.000

 Custo US$ 3,0 bilhões

 Empreendedores BHP Billinton Metais S/A / Construções e

 Comércio Camargo Côrrea S/A / Centrais Elétricas do Norte do

 Brasil  S/A (Eletronorte) / Alcoa Alumínio S/A

 Municípios atingidos Governador Edson Lobão (MA), Ribamar Fiquene (MA),  Montes Altos (MA), Campestre do Maranhão (MA), Porto Franco (MA),  Estreito (MA), Itaguatins (TO), Maurilândia do Tocantins (TO),  Aguiarnópolis (TO) e Tocantinópolis (TO)

 Empresas Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A (Eletronorte) é uma  estatal federal controlada pela holding Centrais Elétricas Brasileiras  S/A (Eletrobrás)

 Populações indígenas afetadas Apinajé (Terra Indígena Apinajé) - interferência direta do reservatório

 Áreas protegidas afetadas Reserva Extrativista Mata Grande (zona do entorno, num raio de 10 km da unidade)

 Áreas prioritárias para proteção da biodiversidade afetadas
 -    Am 143 - Corredor em Açailândia (prioridade Muito Alta).
 -    Ce 236 - Ananás (prioridade Muito Alta).
 -    Ce 238 - Palmeirante (prioridade Muito Alta). -    Ce 239 - Montes Altos-Querubina (prioridade Alta).
 -    Am 133 - Bico do Papagaio (prioridade extremamente Alta). (FONTE: Fundacion PROTEGER, International Rivers e ECOA)

Fonte: oeco.com.br

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