quarta-feira, 30 de março de 2011

Pela suspensão dos financiamentos do BNDES a obras que violam os direitos dos trabalhadores

Nos últimos dias, uma série de violações dos direitos mais elementares dos trabalhadores em obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) têm sido noticiadas pela imprensa: na construção das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira; na construção da Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco; e na termelétrica de Pecém, no Ceará. Apesar destes direitos trabalhistas estarem consolidados em lei, as suas recorrentes violações não fizeram com que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), maior financiador das obras do PAC, suspendesse os financiamentos a essas polêmicas obras. Além disso, o Banco continua a não submeter os critérios de aprovação aos financiamentos e o monitoramento de contratos ao debate público e à fiscalização.

Em setembro de 2008, uma carta do GT Hidrelétricas da Plataforma BNDES dirigida ao banco já alertava para os graves riscos dos projetos energéticos no Rio Madeira e demandava a suspensão do crédito até que as dúvidas fossem sanadas. Dentre os riscos financeiros, ambientais e legais, a carta alertava para “a bomba demográfica e social a eclodir na região em função da constituição de um pólo de atração migratória” e solicitava a abertura de um canal de diálogo com a população afetada pelos empreendimentos, além de informações sobre o tratamento dado pelo banco aos passivos sociais e ambientais gerados por seus financiamentos para a construção de hidrelétricas.

Desde a sua criação, a Plataforma BNDES tem demandado do Banco iniciativas que confiram transparência aos seus financiamentos de modo que a opinião pública e as populações atingidas possam conhecer e incidir sobre os critérios que definem a tomada de decisão e a avaliação dos empreendimentos apoiados.

Apesar de ter respondido à solicitação da Plataforma com a criação de uma “Janela de Transparência”, o acesso à informação ainda é muito restrito e seletivo.

Neste momento, torna-se explícito como a transparência da atuação do BNDES - maior banco de fomento do Brasil e um dos maiores do mundo - é fundamental, já que o Banco tem financiado empreendimentos que violam gravemente os direitos dos trabalhadores, além de muitas outras violações. Estes recentes acontecimentos evidenciam que o BNDES precisa divulgar publicamente os critérios que utiliza para conceder seus financiamentos e para monitorar o andamento das obras.

No dia 23 de fevereiro, vinte dias antes de começarem as mobilizações dos trabalhadores de Jirau e Santo Antônio, uma equipe técnica do Banco visitou as obras e fez uma avaliação positiva do empreendimento. A visita foi noticiada por um jornal local: “Equipe técnica do departamento de energia elétrica do órgão avaliou positivamente a construção do empreendimento. Equipe formada por técnicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) acompanhou na quarta-feira, 23, o andamento das obras na Usina Hidrelétrica Jirau e Nova Mutum Paraná. O diretor Administrativo e Financeiro da Energia Sustentável do Brasil, Paulo Mantuano, recepcionou o grupo de engenheiros, economistas e advogados do órgão (...) “Trimestralmente acompanhamos o empreendimento através de relatórios, avaliamos o andamento físico e financeiro do projeto, ações socioambientais e obrigações contratuais”.1

Importa lembrar ainda que no início de 2008 o Banco anunciou em seu site eletrônico a criação de Cláusulas Sociais, que, dentre outros aspectos, prevêem a suspensão ou exigência pelo Banco do vencimento antecipado do contrato de financiamento, mediante constatação de desrespeito à legislação que trata do combate à discriminação de raça ou de gênero, ao trabalho infantil e ao trabalho escravo ou de eventuais práticas criminosas em projetos financiados pela instituição.2 No entanto, a falta de transparência impede que a opinião pública exerça qualquer tipo de controle social sobre as regras, políticas e cláusulas sociais criadas pelo próprio Banco.

Diante disso, as organizações e movimentos sociais que integram a Plataforma BNDES, demandam:

  1. A imediata suspensão dos desembolsos do BNDES para os consórcios responsáveis (Energia Sustentável do Brasil - Suez, Camargo Côrrea, Eletrosul e Chesf; e Santo Antônio Energia - Odebrecht, Furnas, Cemig, Andrade Gutierrez, Santander e Banif) pelas obras das Usinas Hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, até que todas as demandas dos trabalhadores sejam atendidas e as cláusulas sociais respeitadas;

  1. Uma prestação de contas detalhada dos recursos liberados pelo BNDES e utilizados pelos consórcios até o momento e a publicização desta pelo BNDES;

  1. A instalação de uma Auditoria Pública para investigar a aplicação dos recursos que já foram liberados pelo BNDES para estas duas usinas;

  1. A realização de uma missão permanente do BNDES na região, que tenha como objetivo promover oimediato diálogo com as organizações sociais, de atingidos e de trabalhadores e buscar as devidas soluções para os problemas decorrentes da instalação dos projetos;

  1. A liberação imediata de recursos para a implementação de uma política de recuperação das comunidades e municípios atingidos pelas obras de Jirau e Santo Antônio, com controle social, onde os recursos devam ser planejados, controlados e aplicados prioritariamente em questões sociais, especialmente para os trabalhadores e populações atingidas;

  1. Que o BNDES divulgue em sua página na internet os relatórios de acompanhamento do andamento físico e financeiro dos projetos financiados, ações socioambientais e obrigações contratuais previstas nos contratos, começando pelas Usinas de Jirau e Santo Antônio;

  1. A definição de políticas de Transparência e Controle Social, de modo a contribuir para que o acompanhamento dos desembolsos em investimentos públicos em infra-estrutura sejam de domínio público, e para que haja maior rigor quanto ao cumprimento das metas estabelecidas nos contratos de crédito;
  1. Que o governo brasileiro responda aos questionamentos formulados pelo governo da Bolívia sobre os impactos transfronteiriços gerados pela construção das represas de Jirau e Santo Antônio.


Reforçando o nosso compromisso de luta por uma sociedade justa, solidária e igualitária, em que, necessariamente, os financiamentos públicos são orientados para a eliminação das desigualdades sociais – e não o contrário - , aguardamos um retorno o mais rápido possível.


                                                                                                  Plataforma BNDES, 29 de março de 2011

Fonte:Gabriel Strautman*

*Gabriel Strautman é economista do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS), integrante da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais e da Rede Jubileu Sul.
                                    

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