No dia 25 de junho de 2009, a pedido da Câmara Municipal de Itaituba, no Pará, um representante da Eletronorte fez uma exposição pública dos projetos das hidrelétricas previstos para o rio Tapajós. Chamada de “audiência” pelas autoridades locais e regionais interessadas, a reunião foi criticada pela comunidade e alguns relatos dão conhecimento das já conhecidas artimanhas que as empresas do setor energético usam para justificar o barramento dos rios da Amazônia.
O rio Tapajós é afluente da margem direita do rio Amazonas e nasce da confluência dos rios Juruena e Teles Pires, na divisa dos Estados do Pará, Amazonas e Mato Grosso. Para chegar ao Amazonas ele percorre uma distância de 132 km e no município de Aramanaí atinge uma largura de 19 km.
Nos projetos do Complexo do Tapajós, já com leilão anunciado para 2010, estão previstas a implantação de cinco hidrelétricas: São Luiz de Tapajós, Jatobá, Cachoeira dos Patos, Jamanxim e Cachoeira do Caí, que afetarão os estados do Pará e Amazonas.
A Eletrobrás, uma sociedade anônima de economia mista federal, é responsável por promover os estudos, projetos de construção e operação dos empreendimentos. Os estudos de inventário já foram entregues à ANEEL, e o IBAMA deverá emitir o Termo de Referência para a elaboração dos Estudos de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), para análise que subsidiará a concessão das licenças ambientais.
Usina plataforma?
Para fazer descer a primeira usina do Tapajós goela abaixo da sociedade, a Eletrobrás fez uma espécie de cartilha com material publicitário patrocinado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) em que apresenta “um novo conceito em hidrelétricas” inspirado em plataformas de exploração de petróleo em alto mar, em que o desmatamento seria mínimo.
Lula incorporou a novidade enfatizando a preocupação do governo com a questão ambiental sem saber que está sendo vítima de um engodo. Não há explicações da Eletrobrás sobre a dimensão do reservatório que, pelos parâmetros da recém inventada “tecnologia da hidrelétrica plataforma” não teria que haver supressão de vegetação. O reservatório seria aéreo?
As autoridades do governo federal em especial do MME e da Casa Civil estão tão embriagadas com essa orgia energética que ficaram criativos. Esse folhetim da Eletrobrás apresenta uma chamada “inovação” na construção de hidrelétricas na Amazônia. O tom é de ufanismo, tipo, “hidrelétricas do bem” ou “desmatamento cirúrgico” (inspirado no Bush) ou ainda “reflorestamento radical”.
Essa peça publicitária com propaganda enganosa está sendo distribuída à população na região do Tapajós. O conteúdo, além de conter frases de efeito, é subliminar, faz crer que a construção é iminente, passa batido sobre o processo de licenciamento ambiental e tem ilustrações que levam a falsa impressão de que não haverá impactos ambientais e sociais graças ao novo conceito de “usinas plataforma”.
Tapajós e Belo Monte: histórias semelhantes
Segundo o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDEE) 2008/2017 o rio Tapajós e o Teles Pires teriam o papel de integrar o subsistema Tapajós que, junto com os aproveitamentos de Belo Monte, Santo Antônio e Jirau poderiam gerar 15% do total da capacidade hidrelétrica instalada do Sistema Integrado Nacional (SIN). Dessa forma fica nítido que o planejamento de empreendimentos materializado pelo governo federal poderá afetar a vida de milhares de indígenas e condenar ao obscurantismo todas as dimensões do conceito de sustentabilidade.
Os estudos de viabilidade indicaram um potencial de 14.245 MW previstos para o conjunto de aproveitamentos em cascata, no próprio rio Tapajós e no rio Jamanxim.
A CNEC Engenharia, empresa que pertence à empreiteira Camargo Correa, a mesma que elaborou os estudos ambientais da usina de Tijuco Alto, prevista para ser construída no rio Ribeira de Iguape, no Vale do Ribeira, sul do Estado de São Paulo, identificou inúmeros aproveitamentos na bacia hidrográfica do rio Tapajós. Os estudos de viabilidade consideraram o potencial de energia em especial no rio Tapajós e no rio Jamanxim. Para a escolha desse chamado “potencial”, foi usado o critério de menor impacto no meio ambiente. É uma incógnita a forma como os técnicos dessa empresa imaginaram que isso poderia ser possível.
As grandes empreiteiras brasileiras, como Camargo Correa e Odebrecht, não vão desistir de fazer grandes hidrelétricas enquanto forem apoiadas pelo governo federal que está atropelando a legislação ambiental ajudado pelo grande licenciador Carlos Minc, atual Ministro do Meio Ambiente, que poderá vir a ser conhecido como Minc "O Pródigo"!
O governo incluiu o projeto hidrelétrico de São Luiz de Tapajós, o primeiro previsto para o rio Tapajós, no PDEE 2008/2017, aprovado em julho (2009). Competindo com as usinas Santo Antônio e Jirau no rio Madeira e Belo Monte no rio Xingu no quesito “mega projetos”, o Ministério de Minas e Energia (MME), atualmente sob a batuta de Edison Lobão, pretende que sozinho o aproveitamento no rio Tapajós gere 10 mil MW. Implantar a segunda maior usina do País junto com a de Belo Monte, no Xingu, é certamente uma característica específica de um governo megalomaníaco.
Os estudos de viabilidade dos aproveitamentos hidrelétricos do Tapajós identificam as Terras Indígenas demarcadas Munduruku e Sai Cinza situadas a montante de Jacareacanga. Justamente próximo à Cachoeira de São Luiz de Tapajós e Jacareacanga, é que o governo brasileiro dirigiu sua mira destruidora subsidiado pelos estudos das empresas Camargo Correa, Eletronorte (subsidiária da Eletrobrás) e CNEC. Elas chegaram a conceituar esse trecho com o de “maior conteúdo energético”.
Na década de 1980 a Eletronorte fez os primeiros estudos para barrar o rio Tapajós, com a idéia alucinada de criar um reservatório gigantesco que atingiria a confluência dos Rios Teles Pires e Juruena, além de submergir completamente a cidade de Jacareacanga. Na concepção atual, objeto dos estudos, os novos aproveitamentos ainda poderiam inundar uma parte do Parque Nacional da Amazônia (PNA).
Para dar entrada no processo de licenciamento ambiental o empreendedor preenche uma ficha de informações com os dados básicos do empreendimento. A ficha que corresponde à hidrelétrica São Luiz de Tapajós, no rio Tapajós, especifica que a barragem terá 3,4 mil metros de comprimento, 33 turbinas Kaplan (eixo vertical para alta queda), a área de reservatório será de 722 quilômetros quadrados e seu comprimento de 117 quilômetros.
Por ser o Tapajós um rio federal, o IBAMA é o órgão competente para analisar os estudos ambientais e emitir as licenças. Em se tratando de região amazônica com afluentes como Jamanxim, Crepori e rio das Tropas, o rio Tapajós é especial e deveria continuar incólume banhando as florestas nacionais Itaituba I e II e o Parque Nacional da Amazônia Federal.
As decisões políticas parecem estar sempre acima dos problemas e dos grandes impactos que causam ao meio ambiente físico, ao sócio-econômico, às populações atingidas e em particular aos povos indígenas. As hidrelétricas na Amazônia não levam ao desenvolvimento sustentável ou às dimensões esperadas de qualidade de vida inerentes à dinâmica da preservação socioambiental. A sociedade, mercê da desigualdade que enfrenta pela expropriação do patrimônio coletivo típica do capitalismo, se torna refém de um crescimento e de mudanças causadas por decisões e escolhas do Estado.
Telma Monteiro
Fonte: Blog da Telma Monteiro
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