Edilberto tem 68 anos de idade, 40 de sacerdócio. Trabalhou na organização social das periferias de Santarém e tem efetiva e atuante participação na luta popular organizada em Santarém - Luta contra aqueles que poluem de mercúrio o rio Tapajós. Por esse motivo levou os governos do Pará e do Brasil ao Tribunal de Águas, de Haia, na Holanda em 1991.
Desde 2004, com o Movimento Popular organizado, FRENTE EM DEFESA DA AMAZÔNIA, Edilberto e um grupo de idealistas, incluindo diversos intelectuais paraenses, lutam em defesa do patrimônio etnico, social, econômico e ambiental da região do Tapajós.
Coordenador da Rádio Rural de Santarém, emissora mais ouvida na região, onde coloca sua programação na defesa do nosso patrimônio amazônico, sofre pressão das elites da Região. Seu trabalho nessa linha gera controvérsias. Há quem o aplauda e há quem o conteste fortemente. Muito explícito em seus pensamentos e ações, comete ousadias que incomodam a elite econômica e política da região. Os madeireiros e sojeiros não o toleram, mas a juventude e os pobres o estimulam muito.
Recebeu, em 2006, das mãos do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante Júnior, o Prêmio José Carlos Castro de Direitos Humanos.
Por conta de sua luta, chegou a ser ameaçado de morte em 2007, tendo a OAB/PA à época, solicitado sua inclusão no Programa de Proteção dos Defensores de Direitos Humanos.
Coordenou, em parceria com algumas organizações e grupos militantes em defesa do rio tapajós uma cartilha educativa pela Aliança Tapajós Vivo. Essa aliança Tapajós Vivo é uma composição de pessoas, entidades e povo Munduruku, preocupados com um plano do governo federal de construir cinco 5 mega hidroelétricas na bacia do Tapajós.
1.Qual foi o motivo de ser produzida a cartilha EM DEFESA DA BACIA DO RIO TAPAJÓS?
Edilberto – Quatro anos atrás nosso movimento popular Frente em defesa da Amazônia, FDA descobriu que a Eletronorte vinha estudando um plano de construir cinco mega hidroelétricas, justamente na bacia do nosso rio Tapajós. Desde 1996 seus técnicos vinham estudando a viabilidade, os locais mais adequados, medindo a capacidade das corredeiras do grande rio. Chegaram já ao ponto de estabelecer um cronograma de execução da construção, com pedido de licença prévia, leilão e início de construção. Tudo isso, sem dialogar com nossas populações da região, um plano criado lá em Brasília no Ministério das Minas e Energia. Quando descobrimos a trama do governo, fizemos uma primeira viagem em 2007 às comunidades de São Luiz do Tapajós, Pimental e vizinhas e constatamos que os moradores não sabiam de nada, embora tenham visto pessoas estranhas fazendo medição das águas, olhando a floresta, mas nunca lhes falaram nada. Foi daí que pensamos que deveríamos acordar a nós mesmos e todas as comunidades ao longo do rio Tapajós.
2. E como vocês planejaram esse trabalho?
Edilberto – Primeiro procuramos buscar informações na internet, entre amigos pesquisadores que sabiam mais sobre o assunto, observamos a luta contra a hidroelétrica de Belo Monte, lemos várias revistas da Eletronorte ( Corrente Contínua) e fomos descobrindo que o plano é tremendamente perverso aos povos da bacia do grande rio Tapajós. Em Santarém, a pastoral social da Diocese de Santarém promoveu o primeiro seminário sobre hidroelétricas na Amazônia em 2007. A partir daí, nós da FDA entendemos que era urgente acordar as consciências dos povos de toda a região tapajônica.
3. Por onde começaram essa estratégia?
Edilberto – Como não somos ONG, nem instituição, mas um movimento de voluntários, arranjamos passagens de barco e fizemos parceria com o movimento Br. 163 SUSTENTÁVEL, com sede em Itaituba, que preparou um dia de estudos lá naquela cidade pólo do alto Tapajós. Preparamos documentação em data show e realizamos o primeiro seminário de um dia. Compareceram 70 pessoas da cidade e das comunidades rurais vizinhas. Foi o primeiro arranco. Dois testemunhos daquele encontro nos chamaram a atenção. Um, o presidente do sindicato dos taxistas de Itaituba, tomou a palavra após escutar as informações e disse – “ até hoje pela manhã eu era totalmente a favor das hidroelétricas no rio Tapajós, por que pensava que seria melhoria de renda para nossos sócios taxistas. Agora, depois de ver estas informações que me parecem verídicas e sérias, mudei completamente de opinião, vou combater esse plano do governo”. Um vereador do Partido dos Trabalhadores lá da cidade de Itaituba tomou a palavra e disse –“ é impressionante o que acabo de ouvir, mas agora eu preciso ouvir o que diz a Eletronorte para tomar uma decisão imparcial...”. Seis meses depois, já tendo sido criado o movimento TAPAJÓS VIVO, que ampliou o compromisso de mais entidades, eles nos convidaram para outro seminário de esclarecimento e então, com mais convites. Realizamos um dia de estudo na cidade de Itaituba com 400 pessoas, inclusive com servidores públicos municipais, das unidades de conservação da região e sindicatos, além de um grupo de indígenas Munduruku. No dia seguinte realizamos outro seminário lá onde o governo pretende construir a primeira barragem de 36 metros de altura, em São Luiz do Tapajós. Compareceram 200 pessoas da redondeza. Estes dois encontros foram importantes para o processo de despertar da consciência popular.
4. E o movimento se concentrou só lá no município de Itaituba?
Edilberto - Desde então o movimento se espalhou, vários encontros e seminários têm acontecido em Aveiro, Santarém, comunidades ao longo do rio tapajós, lá na missão Cururu, entre os índios Munduruku, em Rurópolis. Daí foi que surgiu a idéia de se produzir uma cartilha educativa para que os militantes da defesa do rio tapajós e seus povos pudessem utilizar como material pedagógico entre as várias comunidades.
5. Quem faz parte dessa militância?
Edilberto – No início do ano passado houve mais um encontro na cidade de Itaituba, quando 25 grupos construíram a Aliança Tapajós Vivo. Membros de sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras rurais, movimento Br. 163 sustentável, Frente em defesa da Amazônia, aldeia nova Munduruku, aliança francisclareana (franciscanos/as que trabalham junto aos índios Munduruku, colônia de pescadores, entre outros.
6. E a Cartilha que está gerando polêmica na chamada grande imprensa, como foi construída?
Edilberto – Na capa de dentro está explícito que foi um trabalho coletivo. Foi feito um primeiro esboço por dois membros da Frente em defesa da Amazônia, depois enviado para validação por todos os membros da FDA, passou pela revisão de alguns financiadores, feitas correções de conteúdo e gramatical. Os quadrinhos foram obra de arte de dois desenhistas de Santarém. Quem analisa com olhar mais isento de preconceitos verá que ali estão incluídos estilos pedagógicos de diferentes culturas, como a carta dos Munduruku (escrita por um grupo lá na missão Cururu, dentro de um seminário depois de verem um documentário falacioso da Eletronorte e entenderem as ameaças que significarão as hidroelétricas para eles), os desenhos dos quadrinhos construídos em função das pessoas menos letradas e as crianças dos primeiros anos escolares.
7. Como foi então que jornais de Belém e de São Paulo reagiram com acusações de incentivo à violência?
Edilberto – vou reproduzir aqui o que já expliquei ao site IHU online Unisinos, que me fez semelhante pergunta em 25.05.2010:
IHU On-Line – Na sua carta-resposta, o senhor diz que qualquer atitude de inconformismo de movimentos sociais é logo considerada insubordinação à ordem democrática. Como isso acontece em relação ao movimento contra as hidrelétricas no rio Tapajós?
Edilberto Sena – Estamos sendo agredidos, principalmente, em nossa região, no Oeste do Pará. A situação é muito grave. Somos agredidos pelas madeireiras, pelos plantadores de soja que vieram do Mato Grosso do Sul, e pelas mineradoras estrangeiras, como a Alcoa, a Rio Tinto, a Mineração Rio do Norte. Essas empresas estão nos agredindo, dizendo que somos preguiçosos, que caboclo não sabe aproveitar a riqueza que tem. Por último, vem o governo federal e, subserviente a essas grandes empresas, decide implantar essas hidrelétricas na região, tanto no Rio Xingu, que é vizinho nosso, como no Rio Tapajós.
O Presidente da República chegou a dizer que os obstáculos ao crescimento econômico do Brasil são os indígenas, os ribeirinhos, os quilombolas, as ONGs e até o Ministério Público Federal. Comparo, em menor escala, nossa população com o povo palestino diante de Israel, que os trata como descartáveis. Nosso governo e as grandes empresas esquecem que são 25 milhões de seres humanos que vivem na Amazônia. Eles querem que fiquemos calados, de braços cruzados e democraticamente subservientes.
IHU On-Line – A Cartilha em defesa do rio Tapajós sugere alguma reação às hidrelétricas?
Edilberto Sena – Não vamos organizar um exército ou uma guerrilha porque nosso povo é muito pacato. O que queremos com nossa cartilha é que as populações, primeiramente, se dêem conta do que estão armando contra nós. Depois de construir uma barragem – só a primeira tem 36 metros de altura –, o Rio Tapajós será estancado, e isso irá atingir até as belas praias de Santarém.
Despertando a consciência, a cartilha amplia a Aliança Tapajós Vivo. As pessoas que tomam consciência se unem nessa luta para que tentemos empatar esse desastre econômico, social e ecológico em nossa região. Teremos que fazer alguma forma de empate, seja fechando o rio, bloqueando as rodovias, contanto que a sociedade brasileira, que fala da preservação da Amazônia, compreenda o que acontece conosco assim como a situação de Belo Monte.
Essa é parte da entrevista a IHU...
8. Até onde vocês querem chegar com a Aliança Tapajós Vivo?
Edilberto – Até que o governo brasileiro desista de construir cinco hidroelétricas na bacia do rio tapajós, em respeito aos povos que vivem aqui, em respeito ao meio ambiente de bem viver, que é mais importante do que o crescimento econômico à custa de nossa desgraça. Como Chico Mendes, queremos empatar a destruição do rio Tapajós e seus povos.
9. Quem se opõe ou critica essa cartilha?
Edilberto - Até hoje quem tem reagido são os que se beneficiam com a exploração da Amazônia, ou estão a seu serviço.
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